'A família está destruída', afirma pai de trabalhador morto por policiais militares em Salvador
02/12/2024
Welson Figueredo, de 28 anos, foi assassinado a tiros por agentes de segurança pública. Imagens de câmeras de segurança contestam versão apresentada pelos PMs. Welson Figueredo Macedo morreu após ser baleado com um tiro nas costas, em Salvador
Reprodução/Redes sociais
Os parentes do jovem Welson Figueredo Macedo, de 28 anos, lutam por justiça à memória dele enquanto lidam com o luto da perda. Funcionário terceirizado da Empresa Baiana de Águas e Saneamento (Embasa), Welson foi morto em 9 de julho, no bairro de Castelo Branco, por policiais militares.
À época, a PM disse que ele foi baleado em confronto com a polícia após ter roubado um casal. Porém, imagens de câmeras de segurança, obtidas com exclusividade pela TV Bahia, contestam essa versão.
Os registros apontam que Welson saiu do trabalho, deixou um amigo em casa e foi abordado por policiais militares. Ele estava desarmado.
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Ainda assim, o jovem foi baleado por um dos agentes. Ele chegou a ser levado para uma unidade de saúde, onde começou a ser operado, mas não resistiu aos ferimentos.
Para o pai de Welson, Elieson Macedo, tem sido difícil lidar com a dor.
"A família está destruída. Destruiu a minha família e a família de meu filho", declarou em entrevista ao Bahia Meio Dia, telejornal da TV Bahia.
De acordo com Macedo, a mãe de Welson precisou deixar o trabalho, pois segue muito abalada. O jovem deixou ainda esposa e um filho de 8 anos.
Investigação em curso
A morte de Welson é investigada pela Polícia Civil. Em agosto, a instituição chegou a pedir o afastamento dos três policiais militares envolvidos na ocorrência, argumentando que o relatório do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) aponta contradições nas versões apresentadas por eles.
Outro argumento usado foram evidências de que a viatura e a moto de Welson foram removidas do local antes da realização da perícia, o que comprometeu a coleta de provas e a análise da cena. Além disso, as vítimas do roubo informaram que não reconheceram Welson como um dos assaltantes — depoimento que rebate o relato dos policiais.
Apesar disso, o Ministério Público da Bahia (MP-BA) negou os pedidos de afastamento e solicitou novas perícias. Procurado pela TV Bahia, o MP-BA disse que o inquérito está em andamento de forma regular.
De acordo com a Polícia Militar, a sindicância aberta pela corregedoria está em fase final, aguardando o resultado dos laudos periciais.
Relembre o caso
Em nota divulgada à época, a PM disse que agentes da 47ª Companhia Independente (CIPM/Pau da Lima) faziam rondas na região, quando avistaram três suspeitos assaltando um casal. Com a aproximação, o trio teria atirado contra a viatura e fugido em seguida.
Momentos depois, a corporação teria recebido denúncias de que eles estavam no fim de linha do bairro. Com isso, teria ocorrido troca de tiros entre agentes e suspeitos, com um dos criminosos baleado. O suposto assaltante seria Welson, levado para o Hospital Eládio Lasserre, onde morreu durante uma cirurgia. Os militares teriam ainda apreendido com ele um revólver e munições de calibre 38, além da motocicleta.
Cerca de quatro meses após o crime, a TV Bahia reuniu informações que contestam os relatos policiais. Tanto imagens da área quanto os depoimentos das vítimas do assalto indicam que Welson não estava armado. Confira:
O que mostram as imagens
Câmera de segurança mostra momento em que terceirizado da Embasa é baleado na Bahia
De acordo com a Embasa, o funcionário trabalhou regularmente o dia inteiro no dia 9 de julho. Registros da empresa mostram que ele deixou o posto de trabalho às 19h18, pilotando uma moto e com um colega na garupa.
Um outro vídeo, às 19h46, mostra Welson sozinho, trafegando pela praça de Castelo Branco após deixar o amigo em casa. Foram apenas quatro minutos entre o ponto onde ele deixou o parceiro e foi interceptado pela polícia, na Rua Caminho 35.
O relógio marcava 19h50 quando Welson foi visto desarmado e recebendo o tiro. Pelas imagens, é possível ver que a vítima levantou uma das mãos no momento em que policiais e a viatura se aproximaram.
Depois, às 19h52, um dos agentes levantou a moto e colocou o veículo no canto da pista.
Na sequência, os agentes mudaram a posição de Welson e suspenderam a camisa dele. Oito minutos se passaram até que a viatura da 47ª CIPM/Pau da Lima se movimentou e uma segunda viatura, da mesma companhia, chegou ao local.
Somente às 19h59, Welson foi colocado no carro dessa segunda equipe, que não participou da ação inicial. Às 20h, exatos 10 minutos após o disparo, ele foi levado para o Hospital Eládio Lasserre.
O trabalhador chegou vivo à unidade de saúde, passou por cirurgia, mas veio a óbito às 21h20. A perícia aponta que a causa da morte foi traumatismo abdominal provocado por arma de fogo.
O que apontam os depoimentos
O médico que atendeu Welson confirmou que ele deu entrada no hospital com a farda e crachá da Embasa. De acordo com o profissional de saúde, o jovem estava acordado e consciente, mas não chegou a dizer quem disparou o tiro. Policiais militares estavam presentes no momento do atendimento.
A TV Bahia também obteve acesso ao inquérito policial, que ainda está em andamento, mas já indica divergências nos depoimentos dos militares. Os PMs afirmaram que a viatura usada na ocorrência estava danificada e sem condições de trafegar até o hospital, por isso teriam acionado a segunda equipe. Porém, o veículo da 47ª CIPM/Pau da Lima percorreu 4,5 km até a base policial — a distância entre a Rua 35, local da ocorrência, e a unidade de saúde era menor: 4,2 km.
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Os agentes também disseram em depoimento que, após o confronto com os suspeitos e o pedido de socorro, várias pessoas teriam se aproximado do local, entre elas as vítimas do roubo. De acordo com os militares, a mulher roubada teria reconhecido o trabalhador baleado como um dos autores do crime ao apontar e dizer: "Foi ele, foi ele".
No entanto, o casal que teve a moto roubada não confirmou essa versão em depoimento. O rapaz disse que foi questionado se o homem caído era o ladrão, mas respondeu que não sabia. Ele disse que os militares, então, afirmaram que Welson estava junto com os outros suspeitos.
Já a moça declarou: "Nem cheguei perto do homem que estava ao solo. Só passei perto ao atravessar, mas nem olhei para o rosto dele. Em nenhum momento, os policiais mostraram alguma arma que estaria com o homem ao solo nem outros objetos. Não tenho como afirmar que o indivíduo que estava ao solo foi um dos autores do roubo que sofri".
Além disso, a perícia da Polícia Civil não encontrou cartuchos de munição ou vestígios de troca de tiros.
Diante dos fatos que vieram à tona, a TV Bahia voltou a procurar as forças de segurança. Em nova nota, a Polícia Militar disse que uma sindicância foi instaurada pela Corregedoria, "com o objetivo de investigar denúncias sobre possível excesso cometido por parte dos policiais envolvidos na ocorrência". Segundo a corporação, a sindicância encontra-se em fase final de apuração — a pendência é a conclusão de laudos periciais.
Também por meio de nota, a Secretaria de Segurança Pública da Bahia (SSP-BA) informou que determinou a apuração do caso e reforçou que a Corregedoria e o Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) da Polícia Civil investigam a morte.
Na quarta-feira (27), a assessoria do Ministério Público da Bahia informou, por meio de nota, "que acompanha com rigor as investigações do caso, que correm sob sigilo". O MP sinalizou que o inquérito policial está em andamento de forma regular e o "prazo para conclusão da investigação foi estendido com o objetivo de que sejam exauridas todas as diligências investigativas necessárias para produção de provas técnicas".
Comoção na despedida
O sepultamento do corpo de Welson foi marcado por homenagens e indignação por parte de colegas e parentes diante da morte.
Welson deixou esposa e um filho de oito anos
Reprodução/Redes sociais
Dois dias após o óbito, em 11 de julho, eles saíram em carreata, pedindo justiça pelo trabalhador. O grupo foi recebido pela Corregedoria da Polícia Militar, ocasião em que cobrou celeridade nas investigações.
Welson era natural de Ipirá, a cerca de 100 km de Salvador, mas morava na capital baiana há anos. Há 12 anos, ele trabalhava na terceirizada da Embasa. O rapaz deixou esposa e um filho de 8 anos, o pequeno Arthur.
Em entrevista a TV Bahia, nesta terça-feira (26), a viúva, Gilmara Fiel de Souza, e a mãe do jovem, Edilene Figueredo, destacaram a dor com a perda. "Eu perdi a alegria de viver e ser feliz. Procuro e não me acho", disse a mãe do rapaz. Ela e os demais familiares lutam para que ele seja reconhecido como inocente e vítima, e não um suspeito criminoso.
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